sexta-feira, 30 de novembro de 2012

MAPA DA VIOLÊNCIA 2012: A COR DOS HOMICÍDIOS NO BRASIL



1. Questões metodológicas:
Os quantitativos de população por raça/cor de 2002 e 2006 foram obtidos tabulando as projeções da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios – PNAD, do IBGE, desses anos. Em 2010 foram utilizados os resultados do Censo do IBGE desse ano.
As taxas elaboradas relacionando número de homicídios por cor/raça (contidas nas bases de dados do SIM) com os respectivos contingentes populacionais das pesquisas do IBGE, apresentam problemas metodológicos que devem ser levados em conta. A fonte para a população por raça ou cor são as entrevistas da PNAD e/ou do Censo, que coletam esse dado por auto-classificação do entrevistado, que escolhe uma entre cinco opções: Branca ,Preta Parda Amarela ou Indígena. Já nas certidões de óbito, nossa fonte para homicídios, a classificação é realizada por um agente externo ou documentação preexistente utilizando as mesmas categorias do IBGE. Ambas as classificações nem sempre são coincidentes. Por tal motivo, não são os números absolutos, mas as taxas de homicídio e os índices de vitimização os que devem ser tomadas com cautela; são mais aproximativos do que assertivos.
 2. Síntese e considerações gerais da pesquisa:
Entre 2002 e 2010, segundo os registros do Sistema de Informações de Mortalidade, morreram assassinados no país 272.422 cidadãos negros, com uma média de 30.269 assassinatos ao ano.
Só em 2010 foram 34.983. Esses números já deveriam ser altamente preocupantes para um país que aparenta não ter enfrentamentos étnicos, religiosos, de fronteiras, raciais ou políticos: representa um volume de mortes violentas bem superior à de muitas regiões do mundo que atravessaram conflitos armados internos ou externos.
Inquieta mais ainda a tendência crescente dessa mortalidade seletiva. E segundo os dados disponíveis, isso acontece paralelamente a fortes quedas nos assassinatos de brancos. Dessa forma, se os índices de homicídio do país nesse período estagnaram ou mudaram pouco, foi devido a essa associação inaceitável e crescente entre homicídios e cor da pele das vítimas:
• Considerando o conjunto da população, entre 2002 e 2010 as taxas de homicídios brancos caíram de 20,6 para 15,5 homicídios – queda de 24,8% – enquanto a de negros cresceu de 34,1 para 36,0 – aumento de 5,6%.
• Com isso a vitimização negra na população total, que em 2002 era 65,4 – morriam assassinados, proporcionalmente, 65,4% mais negros que brancos, no ano de 2010 pulou para 132,3% – proporcionalmente, morrem vítimas de homicídio 132,3% mais negros que brancos.
• As taxas juvenis duplicam, ou mais, às da população total. Assim, em 2010, se a taxas de homicídio da população negra total foi de 36,0, a dos jovens negros foi de 72,0.
* Entre os jovens a brecha foi mais drástica ainda: as taxas de homicídio de jovens brancos passaram, nesse período, de 40,6 para 28,3 – queda de 30,3% – enquanto a dos jovens negros cresceu de 69,6 para 72,0 – crescimento de 3,5%.
• Com isso, a vitimização de jovens negros, que em 2002 era de 71,7% no ano de 2010 pulou para 153,9% - morrem, proporcionalmente, duas vezes e meia mais jovens negros que brancos.
• Os dados apontam que essa vitimização está crescendo de forma rápida e altamente preocupante pelas suas implicações sociais e políticas
• Outro dado significativo é que o motor dessa vitimização não se encontra no crescimento dos homicídios negros – que aumentaram de forma moderada no período – mas sim nas fortes quedas dos homicídios brancos, o que nos remete não a contextos globais da sociedade, mas sim a estratégias e políticas de segurança e proteção da cidadania que incidem diferencialmente nos segmentos da população, como veremos mais adiante.
Esse é o panorama nacional, algo assim como a média. Mas se descemos às Unidades da Federação temos situações extremas que devem ser fonte de séria atenção:
• Oito unidades ultrapassam a marca dos 100 homicídios para cada 100 mil jovens negros: Alagoas, Espírito Santo, Paraíba, Pernambuco, Mato Grosso, Distrito Federal, Bahia e Pará. São estados que apresentam também elevados índices de homicídios negros na população total.
• Algumas dessas unidades, como Alagoas e Paraíba, por ostentar baixas taxas na sua população branca, atingem índices de vitimização intoleráveis: em torno 20 homicídios de jovens negros para cada jovem branco assassinado.
Essa heterogeneidade é ainda maior quando desagregamos os dados para os municípios, heterogeneidade que permite pensar que o município deveria ser o foco estruturador das políticas de enfrentamento, dada a enorme diversidade de situações e a existência de focos extremos de violência racial inaceitável.
Repetimos a nossa colocação inicial: mais que realizar um diagnóstico, nossa intenção é fornecer subsídios para que as diversas instâncias da sociedade civil e do aparelho governamental aprofundem a leitura dos sérios problemas que os dados evidenciam. Se esse intuito se concretizar, teremos atingido nossa finalidade.

Fonte : Blog "Conversando Direito" e "Mapa da Violência 2012: a cor dos homicídios no Brasil"; páginas 8; 38 - 39)
Acesse, no link abaixo, o documento completo:

quinta-feira, 29 de novembro de 2012

Vitoriosos em capitais no 1º turno receberam R$ 34,4 mi em doações ocultas

As oito candidaturas vitoriosas em capitais no primeiro turno nas eleições municipais de outubro “esconderam” R$ 34,4 milhões das contribuições que receberam de empresas e de pessoas físicas na prestação de contas apresentada ao TSE (Tribunal Superior Eleitoral). O valor aparece nos documentos como doação dos diretórios municipais, estaduais ou nacionais dos partidos – a lei eleitoral permite que isso seja feito. Os recursos representam 62,6 % dos R$ 54,9 milhões arrecadados pelos candidatos que venceram já no dia 7 de outubro.


VEJA AS DOAÇÕES OCULTAS NAS CAPITAIS

CandidatoCapitalDoação oculta (R$)Percentual das doações oculta do total arrecadado (%)
Teresa Jucá (PMDB)Boa Vista1.960.000,00100
Rui Palmeira (PSDB)Maceió3.173,066,0085,43
João Alves (DEM)Aracaju3.437.280,5085,11
Eduardo Paes (PMDB)Rio de Janeiro15.226.400,0072,76
Marcio Lacerda (PSB)Belo Horizonte4.106.000,0067,41
Geraldo Julio (PSB)Recife3.576.213,6249,77
José Fortunati (PDT)Porto Alegre2.519.000,0036,06
Carlos Amastha (PP)Palmas408.950,5410,22%
   Fonte: TSE

Leia a reportagem completa no UOL POLÍTICA, clicando aqui

Análise de Conjuntura: o Brasil que sai das urnas



Concluído o segundo turno, o balanço preliminar das eleições municipais de 2012 começa a ser feito. Quais são as forças e lideranças políticas que saem ganhando e perdendo? Quais são os partidos que saem fortalecidos e fragilizados? Que cenários as eleições municipais prospectam para a disputa de 2014? As eleições de 2012 apresentaram alguma novidade do ponto de vista do comportamento eleitoral? O balanço na sequência procura responder a essas questões e ao mesmo problematizar o conteúdo político dessas eleições.

A análise da Conjuntura da Semana é um documento produzido pelo IHU (Instituto Humanitas, da Unisinos). A análise é elaborada pelo IHU, em sintonia com o Centro de Pesquisa e Apoio aos Trabalhadores – CEPAT, parceiro estratégico do IHU, com sede em Curitiba-PR, e por Cesar Sanson, professor na Universidade Federal do Rio Grande do Norte - UFRN, parceiro do IHU.
Sumário:
Balanço das eleições municipais 2012
Lideranças políticas que saem ganhando
Lideranças políticas que saem perdendo
Partidos políticos que saem ganhando e perdendo
Cenários 2014
Eleições 2012. Despolitização e desideologização

Eleições municipais em frases
Eleições 
municipais em tuitadas

Leia o documento completo clicando aqui

sexta-feira, 16 de novembro de 2012


O Centro de Apoio às Câmaras (Ceac) e a Escola do Legislativo da Assembleia de Minas promovem, até junho de 2013, diversas atividades para os vereadores eleitos e suas equipes.

O Programa de Capacitação em Poder Legislativo Municipal leva aos novos vereadores informações sobre processo legislativo, orçamento e políticas públicas, cerimonial e Lei de Responsabilidade Fiscal. Veja a programação clicando aqui

(Fonte: ALMG)

Sobre o CEAC

O Centro de Apoio às Câmaras (Ceac) facilita o relacionamento com as câmaras municipais do Estado e promove a troca de experiências entre as casas legislativas.
Uma das ações do Ceac é a publicação de boletim semanal com notícias sobre agenda e eventos da ALMG e das câmaras e sobre mandatos parlamentares, legislação e jurisprudência de interesse dos vereadores e servidores.








segunda-feira, 12 de novembro de 2012

Pior seca em 50 anos leva flagelo ao Nordeste

"Nunca vi uma seca assim." A expressão tem sido repetida, em tom de espanto, lamento, tristeza ou desespero, pelos sertanejos afetados pela estiagem que assola o semiárido nordestino - considerada a pior em 50 anos. A afirmação surge em relatos de sofrimento que aflige agricultores, comerciantes, donas de casa, pecuaristas, trabalhadores.

Assim aconteceu em Afogados da Ingazeira, Tabira, São José do Egito e Custódia, municípios do sertão do Pajeú, em Pernambuco, visitados nesta semana pelo Estado. A realidade ali é o retrato do que vivem 10.155.849 pessoas nos 1.317 municípios em estado de emergência em dez Estados - no Nordeste e no norte de Minas.

A reportagem é de Angela Lacerda e publicada pelo jornal O Estado de S. Paulo, 11-11-2012.

A estiagem secou barragens, açudes e rios, devastou pastos e lavouras e provocou escassez de alimento para os rebanhos, que morrem de inanição e sede. Apenas em Pernambuco, que tem 70% do território no semiárido, estima-se a perda de 500 mil cabeças de gado, o que representa redução de 20% do rebanho, de acordo com o Comitê Integrado de Convivência com o Semiárido.

Com semblante fechado, ao lado de duas vacas magras, Jazão José de Caldas, de 69 anos, aguardou desde a madrugada de quarta-feira um comprador para seus animais na feira de gado de Tabira, a 405 km do Recife. Ninguém se interessou. Angustiado, dispunha-se a repassar as vacas para não vê-las definhar. Já perdeu mais de 30 cabeças. Ainda tem cerca de 115, mas não consegue mais dormir.

Sem dinheiro, não tem como comprar ração. Para "enganar" a fome dos animais, usa mandacaru - planta espinhosa da caatinga -, sal e ureia. Tentou um empréstimo de R$ 12 mil no Banco do Nordeste, onde é cliente antigo, para comprar milho. "Lá me mandaram para Afogados da Ingazeira, em Afogados me mandaram procurar o sindicato, no sindicato me mandaram para Tabira. Não sei até quando os bichos vão aguentar", diz ele no seu sítio Jasmim, onde alguns dos seus animais estão mortos pelo chão. Sertanejo duro, foi às lágrimas. "Nunca cheguei a uma situação dessas, nunca."

Carro-pipa
A feira do gado frequentada por Caldas costumava ser a segunda mais movimentada do Estado, só perdia para a de Caruaru, no Agreste. Agora, virou ponto de encontro de lamento. Djalma Jacinto da Silva depende de carro-pipa e já viu morrerem quatro dos seus oito animais. "Parte o coração ver os bichinhos definhando, quando um cai nem sempre levanta mais."

Pedro de Quartim conseguiu vender, na feira, uma vaca leiteira que, além de abastecer sua família, proporcionava a produção de queijo. Seu preço seria superior a R$ 1 mil. Aceitou R$ 200. "Para não ver morrer em casa."

Viúvas
Além de afetar a vida dos pequenos produtores, a seca obriga mulheres a enfrentar sozinhas o drama do dia a dia, porque seus maridos foram obrigados a buscar sustento em outras paragens. São as "viúvas da seca".

Presidente da Associação de Moradores de Macambira, na zona rural de São José do Egito, a 400 km do Recife, Luzinete da Silva Araújo, de 41 anos, é uma das viúvas. Seu marido, o agricultor José Humberto Pereira de Araújo, de 40 anos, viajou há um mês para Curitiba em busca de trabalho. "Conseguiu emprego de carpinteiro", conta ela, que ficou com os três filhos para trás.

Simone Mendes da Silva Oliveira, 24 anos, mãe de um bebê de 4 meses, é a mais triste das viúvas encontradas. Seu marido foi para Brasília há três meses e sofre com saudade do filho. Está empregado e todo mês manda dinheiro. "Quando a seca acabar, vou ganhar meu marido de volta", conforma-se.

A água usada na comunidade vem de carro-pipa, não tem boa qualidade e afeta a higiene e a vaidade.

"Aqui só se lava a cabeça uma vez por semana", conta Luzinete, abrindo um sorriso. "Fica tudo de cabelo duro."



sábado, 10 de novembro de 2012

A elite do poder, de Charles Wright Mills

1956: em plena Guerra Fria, o sociólogo norte-americano Charles Wright Mills publica A elite do poder. Suas pesquisas traziam à luz o conluio de interesses econômicos, políticos e militares. Mills identifica assim um grupo coeso de indivíduos que “podem realizar sua vontade, mesmo que outros se oponham a isso".
Charles Wright Mills (*)   

No interior da sociedade norte-americana, o essencial do poder nacional reside nas áreas econômica, política e militar. As outras instituições aparentam estar à margem da história moderna e, às vezes, parecem se submeter às três primeiras. Nenhuma família exerce nos negócios nacionais um poder tão direto quanto o de uma grande empresa; nenhuma igreja exerce na vida dos jovens norte-americanos um poder tão direto quando o da administração militar; nenhuma universidade pode tomar decisões tão carregadas de consequências quanto as do Conselho de Defesa Nacional. As instituições religiosas, escolares, familiares não são mais os centros autônomos do poder nacional; ao contrário, essas áreas, até pouco descentralizadas, estão cada vez mais submetidas ao poder das três grandes, que são as únicas a tomar decisões de importância capital e imediata.

As famílias, as igrejas e as escolas se adaptam à vida moderna; são os governos, os exércitos e as empresas que a moldam; e justamente por aí eles transformam essas instituições menos poderosas em meios para atingir seus fins. Assim, as instituições religiosas fornecem capelães às forças amadas, que os utilizam para afirmar seu desejo de matar. As escolas selecionam e formam os homens em vista de seu futuro cargo na empresa e de sua futura especialidade no exército. Quanto à família estendida, há muito tempo que a Revolução Industrial a destruiu, e agora o pai e o filho são arrancados de sua família, à força, se necessário, todas as vezes que o exército do Estado os chama sob sua bandeira. E todos os símbolos dessas instituições inferiores servem para legitimar o poder e as decisões dos três grandes.

O destino do indivíduo moderno depende não apenas da família em que nasceu ou entrou pelo casamento, mas também, e cada vez mais, da empresa onde passa as horas mais ativas de seus melhores anos; não apenas da escola onde recebe sua educação de criança e adolescente, mas do Estado que o mantém nas mãos por toda a sua vida; não apenas da igreja, aonde ele vai de vez em quando escutar a palavra de Deus, mas do exército, onde lhe ensinam a disciplina. [...]

Nessas áreas institucionais, os meios de poder de que dispõem os decisores aumentaram em proporções enormes; seu poder central executivo se ampliou; no interior de cada um, desenvolveram um sistema de administração moderno cada vez mais rígido.

À medida que essas áreas aumentam e se centralizam, as consequências de suas atividades se ampliam e as relações com as outras duas ordens se tornam mais numerosas. As decisões tomadas por   um punhado de empresas privadas influenciam não apenas a economia mundial, mas também os eventos militares e políticos.

As decisões da administração militar afetam gravemente a vida política e o nível da atividade econômica. As decisões tomadas na área política determinam as atividades econômicas e os programas militares. Não existe mais de um lado a economia e do outro uma ordem política que contém um aparelho militar sem relação com a política ou com as potências do dinheiro. Há uma economia política unida por incontáveis ligações com as instituições e as decisões militares. Dos dois lados da linha de demarcação mundial que atravessa a Europa Central e passa pelos confins da Ásia, as estruturas econômicas, militares e políticas se permeiam progressivamente.

Se há uma intervenção do governo na economia da empresa, há também uma intervenção da empresa no processo de governo. No sentido estrutural, esse triângulo do poder está na origem de um entrecruzamento de diretórios que desempenha um papel essencial na estrutura histórica do presente.
[...] No cume dessas três áreas ampliadas e centralizadas, aparecem os homens que constituem as elites econômica, política e militar. No topo da economia, entre os ricos da empresa, encontram-se os CEO’s; no alto da ordem política, os membros do diretório político; no topo do aparelho militar, a elite dos soldados-homens de Estado agrupados em torno dos chefes de estado-maior e do escalão superior do comando.

Na medida em que essa três áreas coincidem entre si e que suas decisões se tornam totais em suas consequências, os chefes das três áreas do poder – senhores da guerra, dirigentes de empresa e diretório político – tendem a se unir para formar a elite no poder na América.

Consideramos frequentemente as altas esferas que evoluem em torno desses cargos de comando em função do que possuem seus membros; estes têm mais acesso aos bens e às experiências mais procuradas do que os outros. Vista desse ângulo, a elite se comporia simplesmente de homens que têm mais de tudo aquilo que é preciso ter, quer dizer, geralmente dinheiro, poder, prestígio e todos os estilos de vida que essas coisas permitem.

[...] Mas a elite não é composta simplesmente dos homens mais privilegiados, pois eles não poderiam “ser privilegiados” sem os cargos que ocupam nas grandes instituições, que são, de fato, as bases necessárias do poder, da riqueza e do prestígio, e ao mesmo tempo os meios principais para exercer o poder, adquirir e conservar a riqueza, e obter o alto grau de prestígio que se reivindica.

Por poderosos, entendemos evidentemente aqueles que podem realizar sua vontade, ainda que outros se oponham a isso. Em consequência, ninguém pode ser verdadeiramente poderoso se não tiver acesso à direção das grandes instituições, pois é com esses meios institucionais de poder que os homens realmente poderosos exercem, em primeira instância, seu poder.

[...] Se tirássemos dos cem homens mais poderosos da América, dos cem homens mais ricos e dos cem homens mais célebres os cargos que ocupam nas instituições, se tirássemos deles seus recursos em homens, mulheres e dinheiro, se transferíssemos para longe deles os meios de comunicação de massa que centralizam atualmente a atenção sobre eles, eles ficariam sem poder, pobres e desconhecidos. Pois o poder não pertence de fato a um homem. A riqueza não está centralizada na pessoa do rico. A celebridade não é inerente a nenhuma personalidade. Para ser famoso, rico e poderoso, é preciso ter acesso às grandes instituições, pois os cargos que os homens ocupam ali determinam em grande parte sua chance de obter e manter esses valores aos quais damos tanta importância.

[...] Portanto, é preciso ressaltar um fato que todas as biografias e todas as memórias dos ricos, dos poderosos e dos grandes colocam em evidência: qualquer que seja sua diversidade nas outras áreas, os homens das esferas superiores estão implicados num conjunto de “grupos” que se sobrepõem, de panelinhas unidas entre si por ligações complicadas. Existe uma espécie de atração mútua entre os que “se sentam no mesmo terraço”, ainda que frequentemente esse fato só apareça claramente, para eles mesmos e para os outros, quando passam pela necessidade de traçar uma linha demarcatória; quando, para se defender, eles tomam consciência do que têm em comum e fecham, por consequência, suas fileiras às pessoas externas.

[...] Podemos considerar os homens que ocupam os cargos de comando como os possuidores do poder, da riqueza e da celebridade; podemos considerá-los membros da camada superior de uma sociedade capitalista. Podemos também defini-los em função de critérios psicológicos e morais, e ver neles certos tipos de indivíduos selecionados. A elite, assim definida, é simplesmente um conjunto de homens dotados de um caráter e uma energia superiores. [...] Na verdade, sempre nascem ideias desse tipo numa sociedade onde alguns homens possuem, mais do que outros, o que há para se possuir. Aos privilegiados repugna pensar que são apenas privilegiados. Eles logo acabam por se definir como intrinsecamente dignos do que possuem; acabam se considerando uma elite “natural” e até vendo seus bens e privilégios como extensões naturais de seu eu superior.

[...] No entanto, à medida que a elite floresce enquanto classe social ou conjunto de homens nos cargos de comando, ela escolhe e forma alguns tipos de personalidade e rejeita outros. O tipo de ser moral e psicológico que os homens se tornam é em grande parte determinado pelos valores segundo os quais vivem e pelos papéis institucionais que lhes são permitidos e que lhes são solicitados interpretar. Do ponto de vista do biógrafo, um homem da classe superior é formado por suas relações com os outros homens de seu meio, em uma série de pequenos agrupamentos íntimos pelos quais passa e aos quais poderá retornar durante toda a vida. A elite assim concebida é um conjunto de altas esferas cujos membros são escolhidos, formados, autenticados e autorizados a tocar de perto aqueles que comandam as hierarquias institucionais anônimas da sociedade moderna. Se existe uma chave que permite compreender a ideia psicológica da elite, é o fato de que seus membros, mesmo estando conscientes de quanto o processo de decisão é impessoal, partilham a mesma sensibilidade íntima. Para entender a elite como classe social é preciso estudar uma série de pequenos meios onde vivemos face a face; entre eles, o mais evidente do ponto de vista histórico foi a família de classe superior, mas os mais importantes são agora a “boa” escola secundária e o clube das grandes cidades.

A “elite norte-americana” nos lembra um conjunto de imagens confusas e provocadoras de confusão, e, no entanto, quando pronunciamos ou ouvimos expressões como “classe superior”, “oficiais”, “clube dos milionários”, “poderosos”, temos a vaga impressão de saber o que elas significam, e frequentemente sabemos. Mas o que fazemos raramente é ligar essas imagens às outras; não fazemos mais esforços para formar no nosso espírito uma imagem coerente da elite no seu conjunto.

Mesmo quando, às vezes, tentamos fazê-lo, geralmente chegamos a acreditar que não há uma elite, mas várias elites, e que elas não são realmente ligadas entre si. O que precisamos compreender é que, se não tentamos vê-la como um todo, nossa impressão é unicamente o resultado da nossa falta de rigor analítico e de imaginação sociológica.

[...] Quando os jornalistas sérios nos dizem: “São os acontecimentos, não os homens, que forjam as grandes decisões”, estão fazendo eco à teoria da história considerada como Sorte, Acaso, Destino ou obra da Mão Invisível. De fato, a palavra “acontecimento” é apenas um termo moderno para expressar essas velhas ideias que buscam separar os homens da sua história, porque nos levam a acreditar que a história acontece pelas nossas costas. A história seria algo à deriva; a área da ação, mas não do ato; seria o acidente puro, o acontecimento que ninguém desejou.

O curso dos acontecimentos depende mais, na nossa época, de uma série de decisões humanas do que de um destino inevitável. O sentido sociológico do “destino” é simplesmente este: quando as decisões são incontáveis e cada uma, tomada separadamente, não tem grandes consequências, adicionam-se para formar uma soma que nenhum homem desejou – a história tomada como destino. Mas nem todas as épocas têm a mesma fatalidade.

Como o círculo dos homens que decidem diminui, como os meios de decisão se centralizam e como as consequências das decisões tomam uma amplitude enorme, o curso dos grandes acontecimentos depende frequentemente das decisões tomadas por certos círculos determináveis. Isso não quer dizer necessariamente que o mesmo círculo de homens dirige o fio dos acontecimentos do início ao fim, a tal ponto de a história inteira ser o resultado do seu complô. O poder da elite não significa necessariamente que a história não é forjada também por uma série de pequenas decisões, das quais nenhuma é muito refletida. Não significa que a política em curso e o acontecimento vivo não sejam submetidos a mil pequenos arranjos, compromissos e adaptações. A ideia de uma elite no poder não implica nenhuma concepção do processo de decisão enquanto tal: é uma tentativa de delimitar os domínios sociais nos quais esse processo, qualquer que seja, se desenrola. É a pesquisa dos homens que estão implicados nesse processo.

[...] Se a história tem um sentido, somos “nós” que o daremos por nossos atos. No entanto, o fato é que, ainda que estejamos todos na história, não temos todos o mesmo poder de fazer a história. Pretender o contrário é um absurdo no plano sociológico e uma marca de irresponsabilidade no plano político. É um absurdo porque todo grupo e todo indivíduo são limitados, antes de mais nada, pelos meios de poder técnicos e institucionais dos quais dispõem; não temos todos o mesmo acesso aos meios de poder que existem nem a mesma influência sobre a utilização que deles é feita. Acreditar que “nós” fazemos a história é uma marca de irresponsabilidade política, porque isso nos impede de saber a quem cabe a responsabilidade das grandes decisões tomadas por aqueles que têm acesso aos meios de poder.

Ao estudar a história da sociedade ocidental, mesmo de maneira muito superficial, vemos que o poder dos decisores é antes de tudo limitado pelo nível técnico, pelos meios de poder, de violência e de organização que existem em uma dada sociedade.

Sob o mesmo ângulo, vemos também em toda a história do Ocidente uma linha ascendente e praticamente ininterrupta: os meios de opressão e exploração, de violência e destruição, como os meios de produção e reconstrução, foram progressivamente ampliados e centralizados.
Como os meios institucionais de poder e os meios de comunicação que os ligam entre si são cada vez mais eficientes, aqueles que os dirigem estão na chefia de instrumentos de dominação sem precedentes na história da humanidade.

(*) Este texto foi extraído do livro L’élite au pouvoir [A elite do poder], Agone, Marselha, 2012.

(Fonte e tradução: Le Monde Diplomatique Brasil - Edição especial)

sábado, 3 de novembro de 2012

Voto facultativo: segundo Datafolha, 44% dos paulistanos não teriam ido às urnas


Se o voto não fosse obrigatório, 44% dos eleitores que foram às urnas escolher o prefeito de São Paulo no domingo passado afirmam que não teriam comparecido à votação, mostra o Datafolha.

O cenário não favoreceria nem Fernando Haddad (PT), que saiu vencedor com 56% dos votos válidos, nem seu adversário, José Serra (PSDB). Isso porque o percentual dos que deixariam de votar é semelhante entre eleitores dos dois: 40% dos que declaram voto no petista e 39% dos que votam no tucano.

Entre os que afirmam ter votado branco ou nulo, o índice dos que não teriam comparecido é bem maior: 77%. A pesquisa foi realizada no dia seguinte à eleição.

Se a indicação se concretizasse, a taxa de abstenção na cidade de São Paulo saltaria de 19,99% para 55,2%.

Na eleição de Barack Obama nos Estados Unidos, em 2008, por exemplo, a abstenção foi de 44%. Nos EUA, o voto é facultativo.

Dados da Justiça Eleitoral, no entanto, mostram que o índice de abstenção em São Paulo pode estar superestimado por falta de atualização no cadastro dos eleitores.

O cientista político Vitor Marchetti, da Universidade Federal do ABC, diz que o dado, sozinho, "não indica se uma democracia está instável ou estável". Ele cita como exemplo o alto comparecimento na eleição venezuelana. "Pode ser que a população esteja mobilizada politicamente, mas não em nome da democracia", afirma.

No Brasil, o voto é obrigatório para as pessoas alfabetizadas que têm entre 18 e 70 anos. Quem não comparece nem justifica a ausência é multado em R$ 3,51. Se a multa não for paga, ficará impedido de participar de concursos públicos ou tirar documentos como o passaporte.

Editoria de Arte/Folhapress

PERFIL
O percentual dos que não iriam às urnas em São Paulo é maior entre os que dizem ter renda menor: 48% dos que ganham até dois salários mínimos ante 32% dos que recebem mais de dez mínimos.

A maior inclinação dos mais pobres à abstenção é um dos principais argumentos usados pelos que defendem a obrigatoriedade do voto. Para eles, a exigência é um estímulo para que essa parcela da população seja contemplada nas propostas.

Defensores do voto facultativo, no entanto, afirmam que a obrigatoriedade faz com que eleitores escolham sem conhecer as plataformas dos candidatos em quem estão votando.

Fonte: Portal UOL/(PAULO GAMA)

quinta-feira, 1 de novembro de 2012

Oito milionários conquistam a prefeitura de capitais


Riqueza e poder político vão andar de mãos dadas em oito capitais brasileiras a partir de 1º de janeiro de 2013, quando tomam posse os vitoriosos nas eleições municipais deste ano. Dos 26 prefeitos eleitos nas capitais, oito são milionários, ou seja, ostentam um patrimônio superior a R$ 1 milhão.

No grupo dos oito, há representantes de todas as regiões. O protagonismo é do Centro-Oeste. Cuiabá tem o prefeito eleito mais rico do país nas capitais, Mauro Mendes (PSB), cujos bens alcançam R$ 116,859 milhões. Também no grupo dos milionários está o Alcides Bernal (PP), de Campo Grande, embora com um patrimônio bem menor, de R$ 1,3 milhão. Somando a fortuna de Mendes com o pouco mais de R$ 1 milhão de Bernal e os R$ 152.756,35 declarados por Paulo Garcia (PT), de Goiânia, chega-se a um patrimônio conjunto de R$ 118,31 milhões. Isso faz do Centro-Oeste a região com maior riqueza nas mãos dos prefeitos de capitais.

A reportagem é de Antonio Perez e publicada pelo jornal Valor, em 30-10-2012.



Sudeste, com quatro capitais, aparece em segundo, com R$ 60 milhões. Como no Centro-Oeste, um único político tem a maior parte do bolo. É o prefeito reeleito de Belo Horizonte, Márcio Lacerda (PSB), cujos bens somam R$ 58,86 milhões, o que o coloca na posição de segundo prefeito mais abastado entre as capitais.

A região Norte tem dois representantes no grupo dos milionários. O bolso mais cheio é de Carlos Amastha (PP), terceiro mais rico de todos. Eleito prefeito de Palmas no primeiro turno, ele declarou bens no valor de R$ 18,15 milhões. O outro milionário da região é Mauro Nazif (PSB), de Porto Velho. Com R$ 1,048 milhão, é o lanterninha do grupo dos oito endinheirados. Ao todo, os sete prefeitos das capitais da região Norte tem em conjunto R$ 21,8 milhões.

Os milionários do Nordeste são ACM Neto (DEM), de Salvador, e Carlos Eduardo (PDT), de Natal. Quarto prefeito eleito de capital mais rico, ACM Neto tem um patrimônio de R$ 13,32 milhões. Logo em seguida, na quinta posição no grupo dos oito, aparece Carlos Eduardo, com R$ 2,605 milhões. Já a região Sul tem apenas um milionário. É Gustavo Fruet (PDT), prefeito eleito de Curitiba, com bens no valor de R$ 2,26 milhões.

Do grupo de oito milionários, seis são empresários. E eles são justamente os seis mais ricos - uma informação que parece confirmar a máxima de que, com raras exceções, ninguém constrói uma fortuna trabalhando para os outros - ou seja, como empregado.

Da fortuna de R$ 116,8 milhões de Mauro Mendes, mais de 90% referem-se à participação em empresas, a maior delas a Bipar Investimentos e Participações (R$ 105,718 milhões). Como investidor, Mendes tem R$ 45,49 mil em ações, R$ 21,67 mil em títulos de capitalização, R$ 2,45 mil em um fundo DI e R$ 30,22 na caderneta de poupança. Nas aplicações financeiras, a maioria fatia está em dois planos de previdência privada, cujas aplicações somam R$ 383 mil.

ACM Neto é outro cuja riqueza se deve à atividade empresarial. Dos R$ 13,32 milhões que declarou, R$ 9,384 milhões referem-se a quotas da TV Bahia adquiridas pelo prefeito eleito em 2012. Outros R$ 368,5 mil representam cotas em uma empresa chamada Anre Participações Ltda. Na seara dos investimentos, o herdeiro do "carlismo" é conservador. Tem R$ 1,183 em aplicações de renda fixa no BB e no Bradesco e R$ 879 em um plano de previdência privada do BB.

Os três menos ricos na lista dos oito milionários (Gustavo FruetAlcides Bernal e Mauro Nazif) são justamente os que não tem participações em empresas. Fruet revela-se, contudo, um investidor sofisticado. Seguindo os ensinamentos do papa da diversificação, o economista americano e prêmio Nobel Harry Markowitz, ele evita colocar "todos os ovos na mesma cesta". O prefeito eleito de Curitiba tem dinheiro em fundo DI (R$ 473,5 mil), fundos multimercados (R$ 245 mil), ações (R$ 35,3 mil), planos de previdência (R$ 100 mil) e em imóveis comerciais (R$ 298 mil).



(Fonte: Jornal Valor)
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