Nos últimos anos o aumento no
número de veículos automotores no Brasil foi 10 vezes maior do que o aumento da
sua população: enquanto a população aumentou em 12,2% numa década, o aumento do
número de veículos motorizados foi de 138,6%. Segundo dados disponibilizados
pelo Denatran o país terminou o ano de 2012 com mais de 50,2 milhões de
automóveis e 19,9 milhões de motos. Esse aumento da frota de veículos é
resultado do modelo rodoviarista que caracteriza historicamente a política de
mobilidade no Brasil.
A partir desses dados e no
contexto do Dia Mundial Sem Carro (22/09), o Observatório questiona: podemos
construir um país em que o transporte público coletivo seja prioridade em
detrimento do transporte individual?
Sonhar com dias sem carro,
lutar por dias com transporte público descente
Juciano Martin Rodrigues - Doutor em Urbanismo, Pesquisador do Observatório das Metrópoles, Bolsista de
Pós-Doutorado no IPPUR/UFRJ.
A cada ano, mais pessoas e
entidades aderem ao Dia Mundia Sem Carro (DMSC), iniciativa que começou na
França em 1997. Trata-se de uma ação que tem como ideia principal sensibilizar
e mobilizar a população em torno das diversas questões relacionadas à
mobilidade urbana. No caso brasileiro, chamar a atenção para as enormes
dificuldades que as pessoas enfrentam para se deslocar nas grandes e médias
cidades é urgente e, nesse sentido, o DMSC cumpre o seu papel.
O caos da mobilidade urbana
está presente diariamente no noticiário. O cenário desse caos está completo:
congestionamentos, acidentes e mortes; ônibus, metrôs e trens sempre lotados. O
enredo parece não ter fim: motoristas impacientes nos intermináveis
engarrafamentos, passageiros no ponto a espera de um ônibus que nunca passa e
usuários dos trens andando sobre os trilhos após mais uma pane.
Para piorar ainda mais a
situação, os rumos das políticas continuam privilegiando a circulação de
automóveis. O conjunto de investimentos previstos no campo da mobilidade urbana
no contexto da Copa e as Olimpíadas, por exemplo, reforça e reproduz mais uma
vez um modelo rodoviarista que caracteriza historicamente a política de
mobilidade no Brasil. Modelo esse que explica a atual crise da mobilidade.
No conjunto de intervenções
para a implantação de uma dessas grandes obras - o BRT Transoeste no Rio de
Janeiro - para cada pista construída para a circulação dos ônibus, se construiu
cinco pistas de rolamento para carros. Esse exemplo, evidencia que, na prática,
a provisão de meios de circulação mantém a primazia do setor automotivo,
indicando que o modelo que orienta essas intervenções atende muito
mais aos grandes interesses econômicos – com características de uma política
anticíclica – do que as reais necessidades de deslocamento da população.
Ou seja, há um claro incentivo
ao uso do transporte individual em uma metrópole que viu o número de automóveis
aumentar em 62,7% entre 2002 e 2012. Esse crescimento não é exclusivo do Rio de
Janeiro. O aumento da frota desses veículos nas grandes cidades brasileiras
atinge números ainda mais preocupantes, pois, se hoje há congestionamentos que
têm inviabilizado social e economicamente a cidade, um dos principais motivos é
a simples falta de espaço para os veículos.
A imagem dos congestionamentos é
nitidamente refletida nos números: nas 15 principais regiões metropolitanas 20%
da população leva mais de 1 hora no deslocamento casa-trabalho. Um recente
estudo do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) mostra que, em 10
dessas principais regiões metropolitanas, entre 1992 e 2009, ocorreu aumento no
tempo médio de deslocamento casa-trabalho. Segundo esse mesmo trabalho,
diversos fatores podem ter contribuído para a piora nas condições de
deslocamento, entre eles o aumento da frota de veículos.
Nos últimos anos, o aumento no
número de veículos automotores no Brasil é 10 vezes maior do que o aumento da
população: enquanto a população aumentou em 12,2% em uma década, o aumento no
número de veículos motorizados foi de 138,6%. É o que revela dados preliminares
de uma relatório que está sendo preparado pelo Observatório das Metrópoles, que
será lançado no início de outubro.
Esses mesmos dados revelam que
a frota de veículos automotores é composta majoritariamente por automóveis e
motos: 65,9% são automóveis e 26,2% são motos; outros tipos de veículos somados
representam apenas 7,9%. A sistematização das informações realizada pelo
Observatório, a partir de dados disponibilizados pelo Denatran, mostra ainda
que o Brasil terminou o ano de 2012 com mais de 50,2 milhões de automóveis e
19,9 milhões de motos.
Com isso, a taxa de motorização
no país (número de automóveis para cada 100 habitantes) passou de 14,2,
em 2001, para 22,7 em 2011. Nas quinze principais regiões metropolitanas, essa
mesma taxa atingiu 30,4 automóveis para cada 100 habitantes. Em algumas delas,
é superior a 40 auto/100hab, são os casos de São Paulo (40 auto/100hab),
Florianópolis (41,2 auto/100hab), Campinas (43,2 auto/100hab) e Curitiba (44,9
auto/100hab).
Nas propagandas os carros são
vendidos como a solução ideal para nossa mobilidade. São eles que nos levam com
rapidez, conforto e segurança de um ponto a outro. Nesse mundo perfeito, assim
como o céu está sempre azul, não há congestionamento, as ruas não tem buracos e
sempre há vaga para estacionar. Como vimos acima, essas propagandas ainda podem
convencer muita gente.
Entretanto, no dia a dia, a
realidade é bem diferente para os milhares de moradores das metrópoles:
pedestres e ciclistas não encontram condições seguras e eficientes de
circulação; passageiros dos ônibus esperam por horas nos pontos, sofrem
com a lotação, com os enormes congestionamentos causados, sobretudo, pelo
excesso de automóveis e com os constantes riscos de acidente; passageiros de
trens, metrôs e barcas sãoreféns das panes constantes.
São essas atuais condições de
circulação que tornam campanhas e datas simbólicas como o Dia Mundia Sem Carro
relevantes, principalmente quando os sinais da política pública de mobilidade
apontam para a não resolução dos graves problemas enfrentados atualmente pelas
metrópoles. Por isso, nunca é demais repetir a urgência de uma mudança nos
padrões de mobilidade.
E nesse caso é indispensável
rediscutir e colocar na pauta da agenda das políticas públicas não só
mecanismos de restrição ao uso do automóvel, como rodízios ou pedágios urbanos.
É preciso, além disso, inovar, criar e implantar ações que atraiam o
usuário do automóvel para outras formas de deslocamento. Só ações efetivas
podem convencer as pessoas a não usarem o carro. E isso só será possível através
da provisão de um serviço de transporte coletivo público, eficiente,
confortável e seguro, o que (infelizmente) parece estar bem longe do cenário
que se desenha para o futuro da mobilidade urbana no Brasil.
(Fonte: site do OBSERVATÓRIO
DAS METRÓPOLES)
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