Um programa eletrônico que pode reduzir drasticamente o número de presos com penas já cumpridas no Estado, além de permitir um gerenciamento de vagas prisionais hoje inimaginável, foi apresentado nesta quarta-feira (1º/7/09) na Assembleia Legislativa de Minas Gerais. A apresentação do programa Ficha de Acompanhamento de Penas (FAP) foi feita em reunião da Comissão Especial da Execução das Penas no Estado, atendendo a requerimento do deputado Durval Ângelo (PT), relator da comissão. No mesmo evento, defensores públicos do Estado apresentaram dados e relatório que revelam a economia gerada para os cofres públicos pela atuação da categoria.
O FAP é um programa que permite o acompanhamento e o agendamento da execução penal. Dessa forma, permite um cálculo ágil e antecipado dos prazos em que um preso terá direito à progressão de regime ou liberdade definitiva. A progressão de regime é a mudança na forma de cumprimento da pena, em benefício do condenado. A apresentação sobre o programa foi conduzida pelo promotor de Justiça Fábio Tavares Ribeiro, da Comarca de Governador Valadares.
Para a promotora Ingrid Veloso Soares do Val, também de Valadares, o FAP traz a grande vantagem de corrigir uma distorção do sistema penal. O grande número de processos faz com que a atenção de juizes privilegie os casos em que há frequentes petições em juízo, ou seja, casos em que o preso tem a assistência assídua de um advogado particular. Com isso, a ordem cronológica dos processos fica prejudicada e muitos condenados acabam cumprindo pena maior do que a prevista. O promotor Fábio Ribeiro ressaltou que isso, além da injustiça, gera custos para o Estado, fomenta rebeliões e mais violência.
Com o FAP, é possível fazer um planejamento da libertação dos presos, que também têm uma expectativa de conclusão das penas. Hoje, esse planejamento é impossível, porque nenhum órgão tem um controle eficiente da situação penal de cada detento. Muitas libertações só acontecem após a intervenção de um defensor público e numerosas etapas em que os processos se acumulam diante de um juiz, um promotor ou nas secretarias judiciais. "Quem movimenta a execução penal hoje é a secretaria, não é o juiz, nem o defensor ou o promotor", disse Ribeiro.
A simplificação gerada pelo FAP agiliza o despacho dos processos e torna desnecessária até a intervenção de um defensor em casos simples, onde só é necessário calcular com eficiência o prazo de conclusão da pena.
Programa foi adotado em outros Estados
O programa de acompanhamento das penas, na versão FAP 3, foi utilizado em Governador Valadares entre 2005 e 2007. Neste ano, a operação foi interrompida em decorrência da mudança na legislação, que tornou indispensável uma atualização. Hoje, segundo Ribeiro, está para ser concluída a versão FAP 4, com vários aperfeiçoamentos. O promotor informou que comarcas de diversos Estados já aguardam com interesse a nova versão, diante do sucesso do FAP 3. O maior exemplo é o Espírito Santo, que implantou oficialmente o programa em todo seu território.
Em Minas Gerais, Ribeiro explica que a implantação do FAP de forma generalizada é mais difícil, pelo tamanho do Estado, mais de oito vezes o número de municípios capixabas. Apesar de se planejar, para o futuro, uma interação deste programa com a base de dados prisionais oficial do Estado, a primeira opção foi disponibilizar o FAP para promotores, defensores e demais interessados. Essa distribuição foi feita com a ajuda da Associação Mineira do Ministério Público, mas alcançou comarcas do Tocantins, Bahia, Goiás e de Manaus (AM), onde o programa foi utilizado com sucesso.
O diretor de Articulação do Atendimento Jurídico da Secretaria de Estado de Defesa Social (Seds), Alexandre Martins da Costa, disse que o Estado tem total interesse na implantação do FAP. "Ele permite uma gestão de vagas muito mais eficiente. Posso saber com antecedência quantas vagas serão abertas em determinada unidade", declarou Martins.
O diretor da Seds, assim como o deputado Durval Ângelo, ofereceu a Ribeiro o apoio para a finalização da nova versão do FAP. Até agora, o programa vem sendo desenvolvido por meio de um convênio entre o Ministério Público e a Universidade do Vale do Rio Doce (Univale) em Governador Valadares. Durval Ângelo também disse que, no segundo semestre de 2009, a Assembleia Legislativa pretende convidar os criadores do programa para uma apresentação no Conselho Nacional de Justiça (CNJ). "Também estudamos incluir, na Lei Estadual de Execução Penal, diretrizes que tornem obrigatória a informatização do sistema", disse o parlamentar.
O promotor Fábio Ribeiro disse que a implantação do FAP não esvazia a função do defensor público, apenas evita que ele se ocupe com casos simples, de mero cálculo de pena. "Porque a Defensoria tem que ficar se desgastando em fazer algo que pode ser feito de ofício?", questionou. A defensora Paula Fonte Boa Pinto, de Belo Horizonte, elogiou o programa.
Defensores indicam economia milionária
Durante a reunião da Comissão Especial, defensores públicos da Comarca de Belo Horizonte apresentaram ainda um relatório que indica a economia gerada pelo Grupo de Atuação Estratégica Permanente da Defensoria. De acordo com o defensor Cristiano Moreira Silva, uma atuação de três meses do Grupo, nos municípios de Matozinhos, Sabará e Ibirité, gerou uma economia para o Estado de R$ 1,74 milhão. A cifra inclui o custo diário com os presos libertados, assim como a estimativa de indenizações por prisões ilegais, que deixaram de ocorrer.
De acordo com Silva, se a Defensoria Pública estivesse implantada nos três municípios, a economia seria ainda maior: R$ 2,18 milhões, uma vez que muitas prisões desnecessárias poderiam ter sido evitadas. O relatório completo do impacto econômico do Grupo de Atuação Estratégica foi entregue à Comissão Especial da Assembleia. O trabalho foi elogiado pelo deputado João Leite (PSDB). "Custa muito caro para o Estado não ter a Defensoria Pública instalada em um número tão grande de municípios mineiros", afirmou o parlamentar.
Deputado denuncia violência em penitenciárias
Outro assunto tratado na reunião pelo deputado Durval Ângelo foram denúncias de violência contra internos das penitenciárias de Bicas 1, no município de São Joaquim de Bicas, e Nelson Hungria, em Contagem. Em Bicas, a denúncia é que cerca de 20 presos foram agredidos e punidos coletivamente com isolamento, após protestarem contra a falta de assistência médica a um colega que estava escarrando sangue. Na Nelson Hungria, um ex-policial preso teria sido ameaçado e punido por estar colaborando com a investigação de desaparecimentos de mulheres no Estado.
Presenças - Deputados João Leite (PSDB), presidente da comissão; Durval Ângelo (PT), relator; Lafayette de Andrada (PSDB), Djalma Diniz (PPS) e Carlin Moura (PCdoB). Além das autoridades citadas, participaram da reunião o oficial do Ministério Público em Governador Valadares, Ricardo Miranda de Carvalho; o diretor da Penitenciária Francisco Floriano de Paula, Danilo Marcos de Almeida Gomes; o presidente da Associação Mineira do Ministério Público (AMMP), José Silvério Perdigão de Oliveira; a defensora pública da União, Giêdra Cristina Pinto Moreira; a defensora pública de Belo Horizonte, Déborah Picinin Muzzi; a capelã prisional da Convenção Batista Mineira, Mônica Peixoto; e o representante da Fraternidade Brasileira das Apacs, Flávio Lúcio Rocha.
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