"Os interesses dominantes
controlam a comunicação no Brasil porque o governo permite que assim seja.
Hoje, a "liberdade de expressão" só existe para a grande mídia – um
oligopólio do chamado pensamento único. Se efetivamente o governo quisesse
abrir a possibilidade de outros canais de TV, jornais e rádios, que pudessem
relatar os fatos e expressar os pensamentos que hoje não têm espaço na mídia, o
governo teria de tomar providências nesta direção", escreve Ivo
Lesbaupin.
Ivo Lesbaupin é professor da Universidade Federal do
Rio de Janeiro - UFRJ. É mestre em Sociologia pelo Instituto Universitário de
Pesquisas do Rio de Janeiro - IUPERJ - e doutor em Sociologia pela Université
de Toulouse-Le-Mirail, França. É coordenador da ONG Iser Assessoria, do Rio de
Janeiro, e membro da direção da Abong. Escreve sobre democracia, poder local,
sociologia da religião, comunidades de base, movimentos sociais, política. É
autor e organizador de diversos livros, entre os quais O Desmonte da
nação: balanço do governo FHC (1999); O Desmonte da nação em dados (com
Adhemar Mineiro, 2002); Uma análise do Governo Lula (2003-2010): de como
servir aos ricos sem deixar de atender aos pobres (2010).
Eis o artigo.
É freqüente a denúncia por parte de autoridades do governo de que a grande mídia não faz outra coisa senão atacá-lo. Tem razão, em parte. Há reportagens críticas a algumas políticas públicas, alguns jornalistas se comprazem em encontrar falhas nas medidas tomadas (ou não tomadas) pelo governo. Não poucas vezes, as reportagens e as manchetes exageram quando analisam algum ato governamental – de Lula, até há pouco tempo, ou Dilma, agora. Por exemplo, quando dizem que o mensalão foi a maior caso de corrupção do país. Foi um caso de corrupção, sim, mas não foi a maior, nem tampouco foi exclusivo do governo Lula: o apoio sistemático dado pelas maiorias de algumas assembleias legislativas e de algumas câmaras municipais a seu executivo – governador ou prefeito – só acontece porque existe um mensalão nestas assembleias legislativas e um mensalinho nestas câmaras. A mídia sabe disso, porém, em nenhum momento do julgamento do mensalão, preocupou-se em denunciar ou investigar esta prática nas relações entre o poder executivo e o poder legislativo de vários lugares do país. Nem naquele momento nem hoje.
É freqüente a denúncia por parte de autoridades do governo de que a grande mídia não faz outra coisa senão atacá-lo. Tem razão, em parte. Há reportagens críticas a algumas políticas públicas, alguns jornalistas se comprazem em encontrar falhas nas medidas tomadas (ou não tomadas) pelo governo. Não poucas vezes, as reportagens e as manchetes exageram quando analisam algum ato governamental – de Lula, até há pouco tempo, ou Dilma, agora. Por exemplo, quando dizem que o mensalão foi a maior caso de corrupção do país. Foi um caso de corrupção, sim, mas não foi a maior, nem tampouco foi exclusivo do governo Lula: o apoio sistemático dado pelas maiorias de algumas assembleias legislativas e de algumas câmaras municipais a seu executivo – governador ou prefeito – só acontece porque existe um mensalão nestas assembleias legislativas e um mensalinho nestas câmaras. A mídia sabe disso, porém, em nenhum momento do julgamento do mensalão, preocupou-se em denunciar ou investigar esta prática nas relações entre o poder executivo e o poder legislativo de vários lugares do país. Nem naquele momento nem hoje.
No entanto, a grande mídia não
faz só atacar o governo. Ela aprova explicitamente várias das políticas
desenvolvidas por este governo: aprova o pagamento estrito da dívida pública –
externa e interna – e de seus juros, assim como o esforço para garantir o
"superávit primário". E quando pressiona pela redução dos gastos
públicos, nunca diz que o maior destes gastos públicos é o gasto com a dívida
(quase metade do orçamento público em 2012: 44%). Os gastos que a mídia quer
reduzir são os gastos em políticas sociais – previdência social, saúde,
educação, transporte... A grande mídia aprova também o agronegócio, a
construção de hidrelétricas na Amazônia, a limitação dos direitos dos povos
indígenas, as privatizações, os leilões das áreas de exploração do petróleo.
Ela não tem nada contra a reprimarização da economia que está sendo
implementada pelos últimos governos – Fernando Henrique Cardoso, Lula e Dilma.
Em suma, o governo tem um
grande apoio da mídia nestes elementos essenciais de sua política. A profusão
de críticas se dá em torno de temas secundários.
Mas não é disso que quero falar
aqui. Na verdade, o objetivo deste texto é mostrar que a mídia é assim por
escolha deste governo. As autoridades reclamam, protestam, mas nada fazem para
mudar o ambiente dos meios de comunicação deste país. Contrariamente ao que
fizeram outros governos da América Latina: Chávez, na Venezuela, enfrentou
a oposição da Globo local e, hoje, há outros canais de televisão - inclusive
alguns públicos -, outros jornais e outras rádios naquele país;Evo Morales enfrentou
uma tentativa de golpe na Bolívia, conseguiu debelá-la, e também enfrentou os
barões da mídia local, abrindo a possibilidade de outros canais de TV, jornais
e rádios; Rafael Correia, no Equador, fez o mesmo. Nenhum deles foi
derrubado, ao contrário, foram reeleitos e têm um ambiente de comunicação
bastante equilibrado, onde estão presentes todas as forças do país, não apenas
a dos poderosos.
A Argentina de Cristina
Kirchner enfrentou o "império" de comunicação no país, apoiou a
mobilização dos movimentos sociais e organizações da sociedade civil e
conseguiu a aprovação no Congresso de uma legislação que é considerada por
muitos como a mais avançada do continente.
No Brasil, houve um
esforço, no decorrer do governo Lula, de mudar a situação da comunicação
no país. Nos últimos anos do seu governo, o responsável por esta área, Franklin
Martins, depois de uma série de debates com as organizações da sociedade civil,
entregou às autoridades um projeto neste sentido. No governo Dilma, este
projeto não avançou. E, há pouco tempo, o Ministério da Comunicação veio a
público dizer que não vai mexer nesta questão neste mandato.
Em outras palavras, os
interesses dominantes controlam a comunicação no Brasil porque o governo
permite que assim seja. Hoje, a "liberdade de expressão" só existe
para a grande mídia – um oligopólio do chamado pensamento único. Se
efetivamente o governo quisesse abrir a possibilidade de outros canais de TV,
jornais e rádios, que pudessem relatar os fatos e expressar os pensamentos que
hoje não têm espaço na mídia, o governo teria de tomar providências nesta
direção.
Nosso governo não é mais fraco
que o de outros países da América Latina: sendo assim, só podemos concluir que
é por opção política que, hoje no Brasil, os meios de comunicação continuam
apropriados por um pequeno grupo de “donos da verdade”.
(Fonte: IHU On Line)
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Os comentários são de responsabilidade dos que o escrevem, e não expressam o pensamento do Núcleo de Estudos Sociopolíticos.