Por
Nathalie Beghin, coordenadora da assessoria política do Inesc
Domingo
02 de fevereiro de 2015, com a eleição do Presidente da Câmara, Eduardo Cunha,
o país assistiu ao primeiro ato do novo Congresso Nacional que confirmou o que
sabíamos: trata-se do Parlamento mais conservador desde a redemocratização do
país. Tal Parlamento, cuja composição foi estudada por muitos, inclusive o Inesc[1], é integrado por homens, brancos, ricos,
proprietários e cristãos. As mulheres e os negros, por exemplo, que
correspondem a mais da metade da população, detém menos de 10% das cadeiras,
respectivamente. Os povos indígenas não possuem sequer um representante (confira
vídeo sobre a sub-representação no parlamento aqui).
Pois
esse colegiado elegeu, em primeiro turno, um presidente que é um dos principais
porta-vozes dessa visão de mundo atrasada social e ambientalmente, interessada
na defesa de seus interesses privados e incapaz de pensar o Brasil de forma
estratégica uma vez que as centenas de parlamentares eleitos estão pulverizados
em quase três dezenas de partidos. Eduardo Cunha obteve seu quarto mandato
graças a uma campanha milionária, financiada essencialmente pelo setor privado,
especialmente os setores de bebidas, mineração, telecomunicações e financeiro.
Essas referências associadas a sua liderança evangélica explicam posições adotadas
em legislaturas anteriores: foi contra o marco civil da internet que
contrariava demandas do setor de telecomunicação; indicou o Relator do Código
da Mineração de modo a assegurar-se que os interesses desse setor fossem
preservados; é defensor do financiamento privado de campanha uma vez que
trata-se de um dos principais beneficiados desse modo privatizante de custear
os processos eletivos; é autor do projeto de lei que cria o dia do orgulho
heterossexual e do que pune com até dez anos de prisão os médicos que
auxiliarem mulheres a abortar. “Estamos sob ataque dos gays, abortistas e
maconheiros”, já tuitou.
Soma-se
a este quadro pouco alvissareiro a perda de posições do PT na Mesa Diretora, o
que o levará a buscar a presidência de comissões de peso legislativo. Isto
significa que deverá deixar de lado a Comissão de Direitos Humanos e Minorias.
O cenário mais provável é que a mesma caia nas mãos de algum partido que tenha,
como objetivo, impedir o avanço legislativo em relação aos direitos de minorias
e às liberdades individuais.
Os
direitos humanos nunca foram tão ameaçados como agora. E mais: não há qualquer
chance da proposta de reforma política que defendemos, popular, inclusiva e
participativa, ser aprovada. Nos restam as ruas. Para mudar é preciso fomentar
a politização do debate na sociedade, com força social e política, organização
de base, acúmulo de forças, mobilização e formulação de um novo projeto de
nação e de sociedade que passa, necessariamente, pela construção de outro
sistema político. O ceticismo não é somente nosso: Leonardo Sakamoto ressalta
no seu blog que “além da pressão via mobilização social, vai sobrar para Deus.
Não sou pessoa de fé. Mas se ele existir, que nos ajude”[2].
[1] A esse respeito, ver, por exemplo:
- José Antonio Moroni – Queremos uma nova política: http://www.inesc.org.br/noticias/noticias-do-inesc/2012/fevereiro/queremos-uma-nova-politica-entrevista-com-jose-antonio-moroni
- José Antonio Moroni – Reforma política será desafio
para o novo Congresso: http://www.inesc.org.br/noticias/noticias-do-inesc/2014/dezembro/reforma-politica-sera-desafio-para-novo-congresso
- Inesc – Perfil dos candidatos às eleições de 2014:
sub-representação de negros, indígenas e mulheres – desafios à democracia:
http://www.inesc.org.br/biblioteca/textos/inesc-lanca-o-perfil-dos-candidatos-as-eleicoes-2014-em-seminario-na-proxima-sexta-19-9
- Carmela Zigoni – Democracia em disputa: como a Casa
Grande se renovou nas eleições de 2014:
- http://www.inesc.org.br/biblioteca/publicacoes/artigos/democracia-em-disputa-como-a-casa-grande-se-renovou-nas-eleicoes-2014/view
- Observação: OS ARTIGOS OPINATIVOS PUBLICADOS NO BLOG DO NESP NÃO REPRESENTAM, NECESSARIAMENTE, A OPINIÃO DO NÚCLEO, SOBRE O TEMA PAUTADO.
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